Wednesday, March 28, 2007

Raquel (aka as Raquelinha ou Raquel Pequenina)

Há uns anos (tantos anos) nós estariamos sentados todos no jardim da escola no canto reservado às quatro ou cinco pessoas que lá se sentavam, precisamente de 50 em 50 minutos. A vida era difícil, os namorados estavam longe, ou ainda não tinham aparecido, a farda era horrivel, ninguem gostava de nós, o objectivo de vida dos professores era dar-nos más notas e dizer coisas desagradaveis.
Sentavamo-nos alí todos os dias, às vezes (durante os recreios grandes) comíamos um pão e um lemon cha que nos sabia pela vida. O Rui, sempre a chatear dirte-ia qualquer coisa, sempre com muita piada e nós sem maldade, riamo-nos muito...Não era de ti, era porque o Rui por mais maldoso tinha sempre muita piada.
Eras a mais nova de todas e nós gostavamos todos muito de ti (acho que até mesmo o Rui), era uma pena que tu não soubesses disso.
Nessa altura ainda tinhas o cabelo muito encaracolado, o que te afligia imenso...Nesses dias era o que nos afligia, os cabelos, os topes, as calças de ganga que só compravamos no verão quando iamos a Portugal... Ah Portugal... Lembras-te como nós gostavamos de Portugal?
Não sei se era o ar, o cheiro de Lisboa, a luz e o céu azul, mas qualquer coisa nos fazia amar aquele país que não conhecíamos. No fundo era só o facto de não vivermos lá, mas esses dias cheios de esperança e fé na felicidade certa das férias de verão deixam-me saudades.
O futuro interessava tão pouco, e eu sempre tão certa de mim própria recitava para mim a quantidade de coisas que eu, só eu, sabia...datas ,nomes, acontecimentos, livros, escritores, poemas... Bons tempos, cheios de sol, é uma pena que nós fôssemos tão certas da nossa infelicidade imposta.
Desculpa, é verdade, nunca te cheguei a pedir desculpa por me arreliar tanto contigo. Não fazias nada de mal só trocavas o lugar dos verbos e dos pronomes, e eu era mesmo chata contigo.
As coisas muito más só acontecem aos outros, porquê que os teus pais não te deixavam sair de casa até tarde, lembras-te? Ficavas sempre tão chatiada...
As coisas más só acontecem aos outros, somos tão novas, a vida está só a começar e tu etás tão feliz. Tens um namorado, chama-se André, a tua má nota a DGD não teve mal nenhum e conseguiste ir para uma universidade. És inteligente, já não te enganas nos verbos, e o teu cabelo e o teu corpo já são como tu gostas. Ah aqueles anos horriveis das hormonas saltitantes já estão a passar, a vida é bela e tu vais finalmente para Portugal...É tudo tão prefeito que já não cabes em ti de felicidade...

Nem sabes como eu odeio o tipo que ia a conduzir aquele carro. Odeio-o muito, com muita vontade e ele pode ter filhos e mulher e mãe, que a mim não me faz diferença. Ele roubou-te tudo, Raquel tudo...até o teu namorado chamado André. Pior que tudo roubou-te anos, os que passaram e que tu nunca te vais lembrar e os que hão-de vir.
Desculpa não te ir ver ao teu quarto, em lisboa debaixo do sol e do céu azul que tanto desejavamos, desculpa todos os amigos e memórias que perdeste.
Eu só queria que me respondesses baixinho, mesmo com verbos e pronomes trocados, que te lembras, claro que te lembras do cantinho do jardim onde nos sentavamos a falar mal da vida feliz que tinhamos.
As coisas muito más só acontecem aos outros, e tu ainda estás feliz a passear por Lisboa, com o teu namorado chamado André! Não existe a cadeira de rodas, e tu ainda te lembras de mim.


Beijinhos,

Sarah

Tuesday, March 13, 2007

Primavera



Cá pelas Inglaterras a Primavera é sem dúvida fabulosa. Habituada como estou ás Primaveras chatas de Macau onde a única diferença é a temperatura, não posso deixar de ficar pasmada com as diferenças de estação para estação aqui na Europa. O campo aqui é como o dos desenhos animados da nossa infância, bem verde, tão verde que até o ver eu não acreditava que podiam existir tantos verdes diferentes. Não tem nada a ver com a vegetação acastanhada e rasteira de Portugal, as arvores são frondosas e os pastos perdem-se de vista ( até se vêem ovelhas e tudo). Claro que no fundo do meu coração estarão sempre os prédios altos das cidades que só são grandes em altura, mas ver a natureza com as suas cores e a sua vida é uma alternativa interessante aos grandes blocos de cimento.
Quando se vê o campo inglês durante a primavera percebe-se porque é que eles andam tanto a cavalo. Quando o sol brilha (o que não é sempre) e a temperatura está agradavelmente amena, tudo tem uma dimensão tal que é o que apetece fazer, isso ou correr e rebolar na relva. Claro que eu acabo por nunca fazer nenhum dos dois (ou não fosse eu andar sempre se sapatos altos), mas é verdade.
Um passeio com o cheiro agradável a primavera pelo campo inglês e a apercebemo-nos como o Romantismo só podia ter nascido por estas bandas.

Friday, March 02, 2007

Hoje













Hoje, só hoje
nao me vou lembrar dos que dizem
que nao sou capaz,
Nem dos hipócritas da vida,
Nem dos que fecham os olhos,
Quando já não querem ver,
E depois se esquecem.

O Mundo é dos que gritam!
Dos que cantam a desgraça a sorrir
E nunca perdem a voz,
Nem quando morrem,
Nem quando já não querem ver.

(O Mundo e dos que ousam,
Porque dos velhos do restelo
Não reza a história.)

Hoje só hoje
Quero lembrar os que choram
Os que lutam sem espadas,
E devagar,
Penosamente devagar,
Vao morrendo por dentro,
Sem sangue,
Nem lágrimas.

Hoje,
só por hoje,
Quero ser um poeta.

Sarah